PROGRAMA 75 - ALZIRO ZARUR - continuação 2

    Mas, meus amigos, pouco depois descobri que se tratava de grandes bolas de gelo que caíam implacavelmente. Imediatamente ouvimos um som como de trovão ribombando como dez mil carros furiosamente rodando sobre a artilharia do pavimento. 
    Todo o Bósforo estava em espuma como se todas as baterias do céu estivessem sendo descarregadas sobre nós e a nossa frágil máquina. Para falar com franqueza, nosso destino parecia irremediável. Abrimos até os nossos guarda chuvas para nos proteger, mas os blocos de gelo os desfizeram em frangalhos. Por fortuna tínhamos no barco uma pele de boi sob a qual nos protegemos, salvando-nos assim de mais ferimentos. 
    Um dos três remadores ficou com a mão literalmente esmagada; outro ficou feridíssimo no ombro; mister Herth recebeu uma pancada na perna e a mão direita ficou toda contusa, e todos ficaram feridos. 
    Foi a mais espantosa e terrível cena que jamais testemunhei na minha vida e, não permita Deus, que eu volte a ser exposto a outra coisa semelhante. 
    Bolas de gelo tão grandes como os meus dois punhos caíram no barco e algumas delas com tal violência que, certamente, nos teriam partido uma perna ou um braço se esses membros fossem atingidos por elas.
    Devo dizer que uma delas bateu na haste de um remo e o fendeu.  A cena durou, talvez, cinco minutos, graças a Deus, mas foram os mais terríveis cinco minutos que jamais vivi na minha vida. Quando passaram, vimos os montes vizinhos cobertos de massa de gelo, pois que não lhe posso chamar saraiva. As árvores despojadas das suas folhas e ramos, todos, todos desolados. Árvores completamente nuas.
    A cena foi tão terrível que eu, francamente, não tenho linguagem para descrevê-la. Declaro que testemunhei já vários terremotos, um raio brincou, por assim dizer, por volta da minha cabeça, o vento rugiu, e as ondas a um momento pareceram se levantar ao céu e, no momento seguinte, se arrojar num profundo abismo.
    Tenho estado em combate, tenho visto a morte, a destruição em volta de mim em todas as suas formas de horror, mas nunca dantes tive um sentimento de terror que me empolgou nessa ocasião e que ainda sinto, por vezes, de que receio nunca mais possa esquecer.
    O meu porteiro, aliás, o porteiro mais ousado da casa, que se aventurou a sair um instantezinho fora da porta, foi lançado no chão por um bloco de saraiva, e se não o tivessem arrastado para dentro da casa pelo calcanhar, certamente teria morriido apedrejado.
    Dois barqueiros foram mortos na parte superior da aldeia e muitos ossos partidos.
    Agora, imaginaram o céu subitamente gelado, e o gelo partido em pedaços de tamanhos irregulares com  o peso de meia e uma libra precipitados sobre nós, cá em baixo?" 
    Este é o depoimento de Mr. Herth.

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